Usuários recorrem ao SUS para ter atendimento. Sistema agenda 3.959 consultas entre março e julho para beneficiários

Gabriela Guerreiro
Da editoria de Economia

Revoltados com os serviços prestados pelas operadoras de planos de saúde, muitos consumidores passaram a recorrer ao Sistema Único de Saúde (SUS) em busca de melhor atendimento. Em Goiânia e Aparecida, somente entre os dias 31 de março e 21 de julho, foram agendadas 3.959 consultas na rede pública para usuários de planos privados. A falta de cobertura em determinados procedimentos é o principal motivo apresentado para a decisão. Além disso, os números, divulgados pela Central de Atendimento ao Cidadão (Teleconsulta) da Capital, podem ser muito maiores pelo fato de as pessoas terem receio de informarem que são beneficiárias e terem o agendamento negado.
Ainda segundo a assessoria do Instituto de Desenvolvimento Tecnológico e Humano (Idetech), responsável pelo serviço, essa nova demanda pelo atendimento do SUS pode ser atribuída à celeridade na marcação de consultas, cujo prazo não passa de 7 dias, enquanto que alguns pagantes de planos reclamam de uma demora de até dois meses.
No entanto, a variedade de reclamações é maior. No Brasil, de acordo com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), responsável pela fiscalização do setor, somente nos dois primeiros meses deste ano foram 28.318 queixas, bem maior que no mesmo período de 2010, de 24.166. Elas relacionam-se, em sua maioria, com a negativa de pedidos de cobertura e aumento sem justificativa das mensalidades.
Os mesmos motivos foram verificados pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), cujos índices, no ano passado, mantiveram os planos de saúde, pelo 11º ano consecutivo, em primeiro lugar entre os temas mais reclamados pelos consumidores. Segundo o balanço, 14,53% dos 11.353  foram relacionados a problemas com esses serviços. E ainda, de acordo com o órgão, as recusas na autorização de procedimentos ocorrem justamente nos exames mais caros.
Foi o que aconteceu com a aposentada Sônia Maria Carvalho, 63. Beneficiária há 20 anos de um plano de saúde, para o qual paga R$ 404 por mês (somando o valor referente ao seu contrato e ao da mãe, dependente), ela garante que quase não utiliza os serviços, mas que este ano passou a sentir dores nas costas. “Consultei com um clínico geral que me informou sobre um caroço que precisava ser retirado com cirurgia simples”, afirma. Após ser encaminhada para outro profissional, foi preciso que custeasse uma guia para exame. “Paguei e levei o documento para o cirurgião. Ele olhou e disse, com rispidez, que não poderia fazer o procedimento porque não era autorizado pelo Conselho Regional de Medicina (CRM), relembra.
Surpresa, a aposentada argumentou que já havia quitado a guia e queria saber o porquê da negativa. “Ele então me falou que não tem nada a ver com as guias, que eu poderia tirar até 50 se quisesse, mas que quanto à cirurgia, ele não estava liberado para fazer.”
Com paciência, ela recorreu novamente ao plano, que lhe indicou outro médico, cuja consulta seria disponibilizada mediante novo pagamento. “Custeei outra guia, mas de nada adiantou. O outro me disse a mesma coisa e fui embora, sem saber como proceder para realizar a operação”, reclama, indignada.
Ao contar a história para a mãe, esta lhe sugeriu que pesquisasse os valores para um atendimento particular, mas ela se negou. “Eu me recuso a pagar por uma coisa que já venho direcionando dinheiro há tantos anos, mas também não queria ficar com isso nas costas”, desanima-se. Em seguida, queixando-se a uma prima, foi informada sobre o 0800 do SUS. “O atendimento foi imediato”, conclui.
Quanto à reclamação de Sônia, o presidente do Conselho Regional de Medicina de Goiás (CRM-GO), Salomão Rodrigues, destaca que os profissionais estão tão reféns das operadoras quanto os usuários. Para ele, o cúmulo da situação deve-se a dois pontos principais. O primeiro é referente à extrapolada interferência dos planos na autonomia dos médicos. “Eles querem limitar meios diagnósticos e terapêuticos (através da designação de auditores), dias de internação, inclusive em UTI e exames complementares. Essas coisas têm valor alto para nós e para os pacientes”, explica.
Depois disso, e talvez o ponto que mais tem pesado no conflito de interesses dos dois lados, trata da  remuneração. Representante da classe esclarece que, na visão do CRM, a operadora é uma intermediadora no processo de saúde, mas que tem mostrado características oportunistas quanto a isso.  “Eles devem atuar entre os prestadores de serviços e os usuários. No entanto, recebem muito dinheiro dos contratantes e não repassam com justiça o que nos é de direito”, protesta, exemplificando que alguns planos pagam R$ 20 ao médico por uma consulta. “São valores aviltantes, irrisórios”.

Espera
As novas regras impostas pela Agência Nacional de Saúde (ANS), este mês, alertam que a espera por uma consulta deve ser de, no máximo, sete dias para quem possui planos de saúde e procura por especialistas em pediatria, clínica médica, cirurgia geral, ginecologia e obstetrícia.
Para atendimento com fonoaudiólogos, nutricionistas, psicólogos, terapeutas educacionais e fisioterapeutas, o beneficiário poderá esperar até dez dias e para outras especialidades, 14 dias. A exigência ainda prevê que os exames laboratoriais devem ser agendados em até três dias úteis e os de maior complexidade, em 21 dias.

Sistema é bom, aponta a população

As atitudes de contramão ao esperado, a partir das quais os beneficiários de planos recorrem à rede pública, não são novidade. Em 2008, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) constatou, com base em entrevistas com 392 mil brasileiros, que o atendimento dos serviços de saúde foi avaliado como “muito bom ou bom” para 86,4% das pessoas. No entanto, entre todos os entrevistados, 58,6% haviam sido atendidos em instituições públicas. Soma-se a isso que o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA) já havia concluído, em 2010, que os serviços do SUS são mais bem avaliados por aqueles que costumam utilizá-los, quando comparados com aqueles que não os utilizam.
O aposentado Benedito Torres, 75, cansou de esperar. Pagando R$ 145 pelo plano há dez anos, ele não conseguiu consultar-se com o urologista conveniado. “Está muito difícil. O atendimento sempre foi ruim, mas tem piorado, ficam me enrolando”. Com muitos problemas de saúde, ele usou os serviços do SUS várias vezes. “Só consigo marcar no hospital público e estou até pensando em cancelar meu contrato”, desilude-se, com revolta..
Superintendente do Procon Goiás, Darlene Costa Azevedo alerta que quando o consumidor contrata um plano, deve atentar-se às cláusulas contratuais. “Tem que ler, olhar a cobertura, o que é oferecido, quais doenças não cobre, além de certificar-se se pode sair a qualquer momento”, diz. (Fonte: Diário da Manhã 24/07/11)

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