O jornal O Popular de 23 de julho trouxe uma entrevista com o presidente do Cremego, Leonardo Mariano Reis, na qual ele manifesta preocupação com a possibilidade de retorno de doenças como sarampo e a poliomielite. “Os novos médicos não têm condições de diagnosticar nem doenças simples, quanto mais patologias mais complexas como o sarampo. A chance de passar despercebido é grande, tanto pela formação dele quanto pela estrutura que ele vai encontrar”. Confira:

 

O POPULAR

Sarampo – Diagnóstico é preocupação

Falta de familiaridade de profissionais com a doença e ponto de atenção para gestores da saúde. Como casos estavam erradicados, médicos não conhecem a infecção, sobretudo os mais jovens
De volta ao Brasil em decorrência da crise migratória venezuelana, o sarampo tem preocupado autoridades sanitárias em todo o País por se tratar de uma doença grave e altamente contagiosa. Mais de 500 casos foram notificados na região Norte, mas há registros da doença que estava extinta do País também nas regiões Sul e Sudeste. Por causa do risco de disseminação, instituições públicas e privadas estão mobilizadas no sentido de orientar novos profissionais de saúde que não conviveram com casos práticos de sarampo a ter precisão no diagnóstico.
O Brasil foi considerado livre da doença em 2016 pelo Comitê Internacional de Especialistas de Avaliação e Documentação da Sustentabilidade do Sarampo nas Américas (CIE), mesmo ano em que o continente americano recebeu o certificado da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) de que estava livre do sarampo. Em Goiás, o último caso foi notificado em 1999. Em fevereiro, um bebê venezuelano que não tinha sido vacinado em seu país, foi diagnosticado com a doença em Pacaraima, Roraima, por onde tem entrado levas de imigrantes. O fato alertou as autoridades brasileiras que têm constatado uma queda de vacinação nos últimos anos, deixando a população vulnerável.
O caso recente de uma acadêmica de Direito de 21 anos no Rio de Janeiro chamou a atenção. No dia 13 de junho, sentindo dores e febre, ela procurou um conhecido hospital da capital. Medicada com um antitérmico, voltou para casa e continuou frequentando a faculdade. Já com manchas no corpo, conjuntivite, tosse e febre alta, ela voltou ao hospital outras vezes e foi diagnosticada com zika. Sem nenhuma melhora, no dia 17 decidiu pegar um voo para São Paulo onde vive sua família. Ao desembarcar, a mãe a levou direto ao Hospital São Luiz onde os médicos perceberam a gravidade do caso e a internaram num leito de isolamento. A jovem estava com sarampo.
“Sarampo é uma doença infecciosa viral de alta transmissibilidade. O fato de ter pessoas circulando com o vírus pode desencadear vários surtos. Nós estamos muito preocupados porque trata-se de uma doença grave, que pode levar o paciente ao óbito”, afirma a presidente da Sociedade Goiana de Infectologia, Christiane Reis Kobal, também consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI). Ela lembra que o período de férias eleva ainda mais o alerta e não apenas pela movimentação interna, mas também porque muitos brasileiros vão saem do País. “Há surtos de sarampo na Europa, em diversos países. Quem veio da Copa do Mundo não está tranquilo”.
A SBI tem realizado desde o início do ano fóruns para treinar jovens médicos que nunca viram um caso de sarampo. “É uma doença nova para eles. Vários casos serão notificados como sarampo e na verdade não serão. Na Europa, por não ser uma região tropical, não tem dengue, zika ou chikungunya. Se o paciente aparece com manchas vermelhas, a primeira coisa que o médico pensa é em sarampo. Aqui não, temos de pensar em tudo”, ressalta Christiane Kobal.
Há uma combinação de fatores que contribui para o surgimento de dúvidas no momento do diagnóstico. “Como a doença estava extinta, muitos novos médicos nunca viram um exemplo prático; a população não está totalmente protegida; e há outras doenças com sintomas semelhantes que podem dar manchas vermelhas no corpo”, diz a infectologista. As exantemas – erupções cutâneas avermelhadas – são observadas também em pacientes com outras doenças.

Secretaria orienta médicos
Magna Carvalho, gerente de Vigilância Epidemiológica da Secretaria Estadual de Saúde (SES) concorda que os novos médicos não conhecem sarampo, mas lembra que há um esforço conjunto para preencher essa lacuna. “A primeira coisa que eles têm a fazer é ver a sua própria situação vacinal porque são agentes disseminadores, além, claro de seguir todas as recomendações de protocolo”. No final do ano passado, num hospital da cidade sueca de Gotemburgo, quase 70 recém-nascidos receberam profilaxia pós-exposição por terem tido contato com um profissional de saúde diagnosticado com sarampo que trabalhava na área de saúde materna.
“Não é fácil. Às vezes o quadro é muito semelhante à dengue. São várias doenças que se parecem”, afirma Magna de Carvalho. A SES tem orientado os profissionais que atuam em suas unidades para que façam perguntas definidoras, a exemplo do estado vacinal e de viagens recentes e, em caso de suspeita efetuar a notificação imediata – que é compulsória -, além de isolar o paciente. “Há uma série de ações que precisa ser feita para evitar a transmissão, como vacinação de bloqueio e vigilância dos contatos”.
A presença do vírus de sarampo no Brasil e a baixa cobertura vacinal contra a doença, poliomielite, cachumba e rubéola, levaram o Ministério da Saúde a anunciar para agosto uma campanha nacional de vacinação voltada para crianças de 0 a 5 anos. O dia D da campanha será no dia 14.

Conselho também vê problema

Presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de Goiás (Cremego), Leonardo Reis não esconde a preocupação com a possibilidade de retorno de doenças como sarampo e a poliomielite. “Os novos médicos não têm condições de diagnosticar nem doenças simples, quanto mais patologias mais complexas como sarampo. A chance de passar desapercebido é grande, tanto pela formação dele quanto pela estrutura que ele vai encontrar”. A observação guarda um sistemático questionamento do Cremego sobre a qualidade das faculdades de medicina que disseminaram pelo País. “O melhor que a população tem a fazer é se vacinar e não depender do profissional que vai encontrar nos postos de saúde”.
O tema é recorrente no Cremego, cuja diretoria tem se reunido com o Conselho Estadual de Educação (CEE) para tratar da abertura de novas faculdades de medicina. No final do ano passado a instituição realizou o primeiro Exame de Egressos para avaliar a formação dos profissionais recém-graduados. Por não ser obrigatório, apenas 50 formandos e recém-formados se inscreveram e o resultado foi sigiloso, sendo repassado somente aos participantes. As escolas de onde saíram receberam um relatório de desempenho por área de conhecimento, sem identificação pessoal dos alunos.

Opcional
O registro de novos médicos no Cremego independe da participação deles no exame. Mesmo assim, o certame será realizado anualmente. “Ele não é obrigatório porque depende de legislação, da burocracia federal, mas nossa expectativa é de que isso venha a ocorrer”, diz Leonardo Reis. Para o Cremego, o adequado exercício da medicina passa fundamentalmente pela boa formação no curso de graduação e uma avaliação externa independente.
“As nossas escolas estão muito ruins, até mesmo as federais não têm a mesma performance. São muitos alunos e poucas vagas para residência. A realidade dos alunos de hoje é virtual ou eles estudam com bonecos e nos livros. É preciso equipes treinadas para ser intensificado o diagnóstico correto do sarampo”, concorda Quimarques Cassemiro Barros Santos, há 39 anos na lida médica e fundador da Sociedade Goiana de Infectologia. Para o infectologista, a medicina se aprende em livros, mas também com o paciente, na experiência de examinar. “O ressurgimento do sarampo é uma situação que tende a ser difícil para os novos profissionais”.
Apesar desse cenário de dúvidas, Quimarques Cassemiro não atribui a culpa apenas aos recém-formados. “Não é culpa somente deles. O perfil das doenças muda e há uma deficiência muito grande no ensino de medicina, sem contar que a população também tem de fazer a sua parte se vacinando. “É preciso ter responsabilidade. É o mesmo caso da dengue, uma doença que não é só problema do governo. Se a população não fizer a sua parte, não tem como controlar”.

 

 

(Rosane Rodrigues da Cunha/Assessora de Comunicação – Cremego 24|07|18)

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